A arte espiritual do arco e da flecha.




A arte do arco e flecha está sempre em uso, seja nas nações civilizadas ou entre povos de hábitos selvagens. Nós vemos que Arjuna, que foi um grande príncipe indiano, era dono de um arco maravilhoso chamado Gandiva, presente dos deuses. Só o seu dono era capaz de usá-lo, e, na guerra, ele espalhava terror nas fileiras do inimigo. Arjuna era um guerreiro extraordinário. Ele podia usar Gandiva tanto com sua mão esquerda como com sua mão direita, e em certa passagem do diálogo do “Bhagavad Gita” Krishna (Deus) se dirige a ele dizendo, “tu que utilizas as duas mãos”.


   A arte do arco e da flecha é uma prática que simboliza a concentração. Há o arqueiro, a flecha, o arco, e o alvo a ser atingido. Para alcançar o alvo é necessário concentrar a mente, o olho e o corpo em muitos pontos simultaneamente, enquanto ao mesmo tempo a corda do arco deve ser liberada sem perturbar a mira. O ato de puxar para trás a corda com a flecha deve ser feito no nível correto, com firmeza, e na linha da visão. Quando a força, o impulso, a mira e a linha da visão estão aperfeiçoados, a flecha deve ser liberada suavemente no momento em que há força total, de modo que, pela volta do arco à sua posição normal, ela possa ser deslocada em linha reta até o alvo. Assim também, aqueles que realmente buscam realmente a sabedoria são arqueiros tentando atingir o alvo. Essa é a arte espiritual do arco e da flecha.

  Na arte do arco e da flecha, deve-se assumir uma posição estável, e na busca da verdade esta posição firme deve ser estabelecida e nunca abandonada, se é que se pretende alcançar de fato, em algum momento, o objeto que se tem em mente.


   O olho não deve se desviar do alvo, porque, se isso acontecer, a flecha irá na direção errada ou cairá antes de atingir a meta. Deste modo, se iniciamos a busca da sabedoria, a mente e o coração não devem ter a possibilidade de distrair-se, porque o caminho é estreito, e as distrações de um só dia podem tornar necessários anos de esforço até que se alcance novamente o caminho.

  A qualidade do arco faz uma grande diferença nos resultados alcançados pelo arqueiro. Se não for um arco eficiente, forte e com uma boa elasticidade, as flechas não voarão em linha reta, ou não terão força suficiente para percorrer a trajetória necessária; e o mesmo ocorre com o homem que é o seu próprio arco. Se ele não tiver as características que o tornarão capaz de obter todas as condições indispensáveis, o seu trabalho como um arqueiro espiritual fracassará na mesma proporção.

  Mas ainda que o arco feito de madeira ou aço esteja sujeito a alterações, nós somos intensamente encorajados pela ideia de que, conforme é mostrado pelas leis do carma e da reencarnação, em outras vidas e em corpos melhores nós poderemos fazer um trabalho melhor. O arqueiro diz, também, que o arco frequentemente parece alterar-se de acordo com o tempo ou com outros fatores terrenos, e em alguns dias funcionará muito melhor do que em outros. Mas a corda do arco deve estar sempre firme; e isto, na arte espiritual do arco e da flecha, simboliza a determinação constante de esforçar-se sempre para alcançar a meta.

  Quando a flecha é apontada e lançada, ela deve estar um pouco erguida, levando-se em conta a trajetória a ser percorrida. Caso contrário, cairá antes de chegar ao alvo. Isso exemplifica no plano físico uma das necessidades da nossa constituição humana, porque devemos ter uma meta mental e espiritual elevada, se quisermos ter êxito.

  Não podemos alcançar a mesma altura da nossa meta, mas temos que levar em conta a trajetória determinada pelas limitações da nossa natureza. A trajetória da flecha se deve à ação da força da gravidade sobre ela, e as nossas aspirações têm a mesma curva, em consequência da atração dos sentidos, dos defeitos hereditários e dos maus hábitos que nunca nos permitem fazer tanto quanto gostaríamos de fazer.

Vamos atingir o alvo, ó amigo! E o indestrutível alvo é a mais alta vida espiritual de que somos capazes.

Esse artigo foi traduzido da coletânea em dois volumes “Theosophical Articles”, de William Q. Judge, Theosophy Co., Los Angeles, 1980, ver volume II, 655 pp., pp. 389-391. Título original: “Hit the Mark” (literalmente, “Atinja o Alvo”). O texto foi publicado originalmente na Revista “Path”, de Nova Iorque, em setembro de 1890, sob o pseudônimo de “William Brehon.
Krsna e Arjuna